‘Tenho orado por você, Francisco, para que não lhe falte fé’

Élvio Figur*

Jorge Mario Bergoglio, ou Francisco, em sua primeira fala depois de escolhido como novo líder da igreja católica, não usou a palavra Papa uma única vez. Ao contrário, referiu-se a si como bispo de Roma, o que demonstra sua simplicidade e humildade. Além disso, poucas horas depois de sua eleição, ele teria ‘escapado’ do Vaticano em um carro comum para rezar, e aproveitou a saída para pagar suas contas e tomar seus pertences deixados no hotel antes do conclave. No dia seguinte ele novamente teria deixado o Vaticano ‘às escondidas’ para visitar um amigo no hospital. Dizem também que, quando era bispo, ele costumava viajar em transporte público e cozinhava sua própria comida em um pequeno apartamento. Aos seus colegas argentinos teria sugerido que não gastassem seu dinheiro para viajar à Roma para sua cerimônia de posse, mas que doassem o dinheiro aos pobres. (Folha de São Paulo. 16.03.2013). Para uma igreja manchada por discussões e intrigas envolvendo disputas pelo poder, Francisco, o simples, parece estar seguindo as orientações dadas por Jesus aos seus discípulos momentos antes de sua paixão e morte quando estes discutiam sobre qual deles era o ‘mais importante’ (Lc 22.24). Ele disse; “... entre vocês não pode ser assim; pelo contrário o mais importante deve ser como o menos importante. E aquele que dirige, seja como o que serve” (Lc 22.25 e 26).

Jesus propôs à igreja que ela deveria ser humilde, e considerar o servir como a maior grandeza. Ainda no evangelho de Lucas capítulo 22, encontramos outra lição dada por Jesus diretamente ao seu discípulo Simão Pedro, tido como o primeiro líder da igreja cristã; “Simão, Simão, escute bem! Satanás já conseguiu licença para pôr vocês à prova. Ele vai peneirar vocês como o lavrador peneira o trigo a fim de separá-lo da palha. Mas eu tenho orado por você, Simão, para que não lhe falte fé. E, quando você voltar para mim, anime os seus irmãos” (v.31). O inimigo não estava satisfeito apenas em ter conseguido Judas, ele queria a todos os discípulos. Ele queria destruir a obra de Deus e, por isso, Jesus adverte que Satanás iria peneirá-los por meio de tentações e aflições que viriam a fim de tirar-lhes a fé. No entanto, de maneira muito especial, Simão Pedro, como um dos líderes da igreja cristã primitiva, estava incluído nas orações do próprio Senhor; “Eu tenho orado por você, Simão, para que não lhe falte fé” (v.31). Pedro vacilaria na fé e negaria conhecer Jesus por três vezes seguidas. Mas a oração do próprio mestre era no sentido de que a fé de Pedro não se perdesse para sempre, e após o canto do galo, ele deveria animar e fortalecer os demais discípulos e irmãos na fé.

Foram tempos difíceis para os discípulos. Entretanto, o aviso de Jesus cabe também a nós cristãos do mundo todo, pois o inimigo está colocando o cristianismo à prova. O cardeal Jorge Mario Bergoglio parece ter captado essa mensagem. Quando ainda era arcebispo em Buenos Aires, ele disse com toda clareza e simplicidade; ‘Não sejamos ingênuos: não se trata de uma simples luta política. Pretende-se a destruição do plano de Deus. É uma jogada do pai da mentira para confundir e enganar os filhos de Deus’ (Sobre a união homossexual, Revista Veja, 20 de março de 2013. P.71). O novo ‘bispo de Roma’ parece estar disposto a enfrentar todos os desafios como um servo dedicado e humilde (Lc 22.33). Em sua primeira homilia na condição de bispo de Roma ele procurou animar seus irmãos; ‘Espero que todos nós, nesses dias de Graça, tenhamos a coragem de caminhar na presença do Senhor, com a cruz do Senhor. De edificar a Igreja com o sangue do Senhor... ’. Parece que ouço Jesus dizendo; ‘Eu tenho orado por você, Francisco, para que não lhe falte fé’ (Lc 22.31).

*Teólogo, pastor da Igreja Evangélica Luterana do Brasil em Juiz de Fora, MG